sexta-feira, 28 de setembro de 2007

No cult ... só orkut

Certa vez decidi ser cult. Achava bonito aquele lance de saber de um bocado de coisa sobre um assunto e ficar falando horas e horas sobre algo que não interessa a quase ninguém e todo mundo me achar inteligente.
O primeiro passo foi comprar um livro interessante. Fui à livraria mais badalada da cidade. Era meio livraria, meio café, meio sebo e meio museu ou seja: para mim era meio nada que provavelmente me levaria a lugar nenhum. Porém, ser cult é também transcender a barreira do “isto” para vagar incessantemente pelo caminho dos “aquilos”.
Bom, voltando para livraria e sem sair dela, óbvio, fui direto para a estante de FILOSOFIA. Muitos nomes interessantes, a maioria trazia orelhas prolixas, outros além das orelhas tinham perdido os pés e as cabeças. Foi aí que descobri que todo livro de filosofia parece tratar de algo que todo sabe que existe mas ninguém se dá o trabalho de falar por ser obvio demais.
_Que ótimo! –pensei- Acho que vou levar esse grande aqui, só preciso aprender a pronunciar o nome do autor e tá tudo certo.
Não sabia eu, pode coitada, que em livraria cult ninguém passa despercebido e enquanto folheava os livros estava sendo observada por um grupo de cabeludos, barbudos e mal vestidos que pareciam ter saído do fundo da garrafa com suas blusas de malha amarrotadas. Foi aí que tive a minha primeira lição do mundo cult: Quem é cult, jamais, em hipótese alguma, entra em uma livraria sem pedir opinião e engatar uma discussão qualquer.
Gente cult ADORA discutir, é o que mantém a cultura cult, perdoe-me a redundância, mas me reservo o direito de atribuir este conceito a esta parcela da população brasileira abastada intelectualmente.
Eu que entrei quieta e saí calada chamei atenção dos cabeludos que tentaram puxar assunto sobre uma tal “Abordagem existencialista sobre liberdade nas fotografias de Toscano”. Eu, naquele momento ex- BBB para o Roda Viva me limitei a sorrir monalisicamente e passar no caixa, não sem antes catar na prateleira o novo lançamento da L& PM: uma coletânea inteira de tirinhas, isso sim é legal!
Bom, esse investimento cult só durou algumas horas, o tempo suficiente de chegar em casa e simplesmente ESQUECER que havia gastado quase o meu salário todo em um livro que eu nem sei quem escreveu.
Certo é que fizeram meu cadastro na tal livraria e meses depois me mandaram uma mala direta de um evento cultural que a livraria estaria promovendo (e eu que nem sabia que era cult mandar malas diretas!).
Curiosa como sou, lá fui eu toda faceira para uma mesa redonda sobre poesia. Sempre achei poesia tão romântico... achei que, finalmente, tinha encontrado o meu lado cult.
Foi aí que tive a minha segunda lição sobre o universo cult: quem é cult é pontual. Paguei o maior mico chegando com meu sapato de salto bem na hora da exibição de um curta-metragem.
Depois de uns 15 segundos desfilando pela platéia e provavelmente sendo ridicularizada por quem estava lá, consegui um lugar na terceira fila. Fitei a tela com bastante atenção pois sabia que seria uma tarefa no mínimo complicada entender aquele filmezinho com um passarinho e um menininho. Não tinha falas, nem legendas. A trilha parecia composta pelo próprio menino ou quem sabe, pelo passarinho.
No final da exibição todos aplaudiram emocionados e eu, claro, aplaudi também, mais para dar apoio moral a quem aplaudiu primeiro do que como incentivo ao cineasta.
Quando as luzes se acenderam vi meninas vestidas a la Amelie Poulain com lágrimas nos olhos, vi também misturas transgênicas de Marcelo D2 e Che Guevara com os cantos da boca cheios de espuma de tanta empolgação. E eu lá, isolada, vestindo uma saia jeans. Que idéia a minha vestir saia jeans e sapato de salto! Foi então que tive a minha terceira lição sobre o submundo cult: Quem é cult adora a diversidade, a universalidade da experiência, a transcendência do pensamento e não suporta quem faça isso fora de padrões pré-estabelecidos por alguns autores escolhidos por eles, ou seja: quem é cult é pré-conceituoso.
Enquanto estava refletindo sobre a minha posição desfavorável para uma saída discreta, um rapaz ao meu lado se levantou e começou a recitar, em transe, um poema erótico. Do outro lado, um senhor já de cabelos brancos acompanha a apresentação do rapaz com entusiasmo e em coro, começam os dois a recitar até o final o que eu chamaria de “pornesia”, meu estômago já estava embrulhando quando uma mocinha de cabelos cacheados e sarongue levantou e falou um haicai que pelo que pude perceber não deveria ter sido traduzido ainda. Com medo de ser a próxima a ter que levantar para falar algo, preferi levantar para mostrar o quanto meu salto faz barulho no assoalho enquanto dava o pé dali.
Minha ultima lição sobre a essência cult é que apesar de serem chatos, àqueles que dizem ser a elite intelectual do planeta estão nada mais nada menos do que garantindo sua sobrevivência no mundo cruel da fama relâmpago e que no final, eles querem assim como nós, “orkuteiros narcisistas que adoramos expor nossas vidas ao publico” expor sua vida, seu gogó e seu gosto duvidoso pela arte dos outros. E não venham querer me convencer que uma pessoa que levanta em publico e recita um poema de Aretino como se fosse um personagem de garganta profunda (versão cult, claro) não quer se expor... fala serio!
Foi aí que lembrei que era sábado e o ultimo episódio da novela das oito seria exibido pela ultima vez. Ainda bem dava tempo chegar em casa e enfim, me divertir um pouco.

7 comentários:

Roberto Ivo das Neves disse...

vc pensou que os sujeitos de uma "tribo" moderna qualquer estariam se anulando? não. é apenas mais uma forma de serem vistos. e entre esses, como entre todos, de qualquer tribo urbana-moderna há os que querem mais ser notados que outros. mas não há como se pronunciar sem aparecer junto com a palavra. mas uns se colocam na frente, antes do discurso. a forma vira conteúdo. de que? do EU do falante. o EU é o conteúdo, a fala é meio para tal.
mas nem sempre é assim, creia, ou melhor, olhe mais um pouco e verá que é como toda tribo, toda igreja, todo grupo, toda família, existem uns e outros, linda (e não se culpe pelo seu narcisismo. se eu fosse belo como és bela, eu tb seria bem mais narcisista. o problema é que aí ninguém me suportaria e a solidão seria imensa).

Aline Mororó disse...

viu...um comentario cult :p

DJAMAN BARBOSA disse...

Clap, clap, clap. Excelente estréia. Obrigado or vir enriquecer a tal blogsfera, seja lá que diabos for isso.

E se o blog só servir para satisfazer o seu ego... bem... de um blogueiro para outro... há algo mais importante, afinal?

Deby disse...

Não poderia deixar de ser diferente sua estréia na blogosfera: divertida e nada cult....rsrs
Cult é o comentário de Pedro.
Ah! Não deixe ele ler o meu blog. Vai me achar nada divertida, muito menos cult, talvez narcisista...hehe
bjos, gata. Seja bem-vinda
ah! pode deixar q te ensino alguns macetes e te apresento aos meus amigos blogueiros.

Kamile Guariento disse...

kkkkkkk

Muito bom!!!! Mas nem venha me falar que vc nao gosta de coisinhas cult, pois seu marido é totalmente cult :)

Beijos e adoro esse lado de cá seu.

Martins disse...

AUhaUhaUhAUAHAUHua

Perfeita Narrativa. Eu Vi tudo !! E o final excelente foi só o grande Brinde !

AUHAUhaUhaUha

Anônimo disse...

o que eu estava procurando, obrigado